sábado, 23 de maio de 2009

Platão

Eu já tinha pensado se ele estaria lá. Nao foi adivinhaçao, o pensamento era recorrente, sem importancia. Apesar de nao ser total surpresa ele estar onde antes eu já o vira,naquela sala de cinema, senti a pulsação d'eu ter corrido antes somando, multiplicando, com o que era o ver.
Sentei na mesma fileira. Depois levantei, fiz que pensei um pouco, e sentei do lado dele. Ele nao se virou. Segurava um livro, um pocket book. Como na primeira vez. Nao estava com aquele all star amarelo. Lá se foi a oportunidade de começar a conversa perguntando ''bonito all star, onde comprou?''. Calça preta skinny, mas nao justa demais. Camiseta branca, talvez de alguma banda, quem sabe. Como da segunda vez, que era do Velvet Underground. Cheguei até a ouvir a banda uma vez. Nao me liguei na musica, mas sei la, estilo, usar camiseta do Velvet. O logo foi feito pelo Andy Warhol, é um começo. Ele dedilhou um pouco em cima da capa do livro, talvez alguma musica. Talvez ele toque piano, piano clássico.
Desligavam-se as luzes, começava o filme. ''Crônicas de um amor louco'', baseado no livro de Bukovsky. Ele riu um pouco com o titulo do livro. Eu sentia a presença dele. Sentia até o cheiro. Sentia vontade de passar os braços sobre o ombro dele, encostar nele, encoxar ele. Nao, seria muito estranho. Será que um dia eu iria encoxar ele? Será que um dia a gente se conheceria e chegaria nesse ponto? Tudo dependia de eu falar com ele depois que o filme acabasse.
O filme era sobre um poeta. Na primeira fala do filme ele dizia
''Chega de papo-furado e vamos direto ao que chamamos de “Arte”…
Estilo.
Estilo é a resposta de tudo.''
E eu pensei que ele, nao o personagem do filme, foi lá para ver esse filme que dizia isso. Nada mais condizente com ele. Um filme sobre um poeta que leva, mas principalmente se deixa levar pelos seus amores breves. Que penetra em cada um sem medo, sem apreensões, sem preconceito. Pelo contrario, ele se deixa atrair pelas mulheres mais bizarras, diga-se de passagem. E eu vi o filme pensando em como falar com ele.

Acabou o filme, e ele tirou o celular do bolso, ligou para alguem e ficou falando no celular enquanto andava. Pensei em perguntar qual era mesmo o nome do livro do Bukovsky, quando ele desligasse o celular. Mas ele continuou falando. E ele falou no celular que odiou o filme, que nao devia nem ter ido, que o filme é péssimo. E disse que já estava indo, e saiu, andando rápido.

E entao, nao sei exatamente porque, eu broxei completamente. Nao só pelas minhas filosofias cinéfilas de que nao se pode dizer que o filme é ruim imediatamente depois de ve-lo, sem pensar, e que na maioria das vezes que se diz isso é porque nao entenderam nada do filme. Se pode dizer que nao gostou, mas nao que é ruim. Deve ter sido porque eu achei ele um idiota. Um idiota que nao teve capacidade de entender a visao de mundo daquele poeta. Um idiota que nao era o que eu pensava, e que, principalmente, faria uma cara estranha se eu tivesse falado com ele, com um estranho.

Talvez eu devesse ter falado com ele antes do filme começar. Eu devia pensar menos no que poderia dar certo, e falar e pronto. Se ele achasse estranho, foda-se. O problema é que eu achava ele único, de certa forma. Uma forma generalizada de idealizaçao. Eu nao imaginava muito, só nao imaginava que ele ia ser um idiota. Que a parte que eu quero foi o que eu vi antes, o cinema ''alternativo'',o livro, o dedilhado, o all star, o estilo, a atraçao física. E só.

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